Setor exige cada vez mais qualidade da gestão e abre oportunidades de carreiras. O maior desafio é a inadimplência
Quase um terço das administrações de edifícios do DF precisa de taxas extras para tocar obras de manutenção e reformas de fachada
O próspero negócio dos condomínios
Na Brasília das superquadras, dos arranhas-céu de Águas Claras e dos luxuosos prédios do Noroeste e do Park Sul, o mercado dos condomínios movimenta cifras bilionárias, cria milhares de empregos e gera oportunidades de negócio. Levantamento inédito, feito a pedido do Correio pelo sindicato local, indica que existem cerca de 7 mil edifícios residenciais do Distrito Federal. Por ano, somente com a taxa mensal paga pelos moradores, os síndicos e as 300 empresas especializadas administram um total de R$ 2,6 bilhões, valor turbinado pelas reformas de fachada e pelos investimentos em segurança.
As taxas de condomínio, alvo recorrente de questionamentos em assembleias esvaziadas, variam de R$ 200, em regiões administrativas com perfil de renda mais baixa, a mais de R$ 3 mil, no caso dos apartamentos de maior metragem. Quase um terço dos condomínios residenciais do DF cobra hoje a temida taxa extra, muitas vezes incorporada ao boleto por tempo indeterminado. Obras nos sistemas elétrico e hidráulico e, sobretudo, para melhorar a aparência dos edifícios ajudam a explicar a necessidade de arrecadar dos proprietários mais do que a quantia ordinária.
Na conta dos síndicos e das administradoras, 60% da receita, em média, se destinam ao pagamento dos funcionários: são quase 30 mil porteiros, zeladores, vigias noturnos e auxiliares de serviços gerais. Outros 25% vão para as tarifas públicas, com peso maior para gastos com consumo de água. Sem dinheiro para individualizar os hidrômetros, a maioria dos condomínios continua rateando a fatura, o que encarece o total. Fecham a lista de compromissos despesas diversas, como compra de materiais de limpeza e manutenção de elevadores. O que não entra nesses cálculos exige taxa extra.
Novo perfil
Em média, com inflação e aumento dos gastos, a taxa de condomínio sobe de 10% a 12% ao ano. Há casos, porém, em que o síndico consegue ajustar o orçamento, economizar e segurar a alta por até três anos. O principal desafio é preparar bem quem cuida das finanças do prédio e fazê-lo entender que aquele dinheiro não é dele.
O conceito de terceirização dos síndicos avança, ainda que a passos lentos. Na capital federal, o número de condomínios administrados por quem não mora no local não chega a 1 mil, quase 15% do total. “O perfil do síndico mudou, ele precisa ser um gestor. As pessoas vão entender que esse é o caminho”, defende Cléa Torres da Silva, 64 anos, atualmente administradora de quatro prédios. Com a demanda aquecida, ela se programa para, em 2015, atender mais condôminos insatisfeitos. Em um dos edifícios assumidos por Cléa, a síndica anterior é acusada de desviar mais de R$ 300 mil.
Há 1240 processos jurídicos em andamento no TJDFT. Referem-se a suspeitas que recaem sobre as contas do prédio, causas trabalhistas nunca resolvidas e histórias esdrúxulas de inadimplência. Não é raro a Justiça tomar imóveis nas asas Sul e Norte das mãos de mau pagadores. Antes de comprar o apartamento, a pessoa deve, no mínimo, pesquisar a taxa de condomínio. O índice médio de inadimplência no DF é de 10%, mas há prédios onde mais da metade dos moradores estão com pagamentos atrasados.
Taxas eternas
No início do mês, quitar a taxa de condomínio é prioridade para o aposentado Maury Alves, 78, que vive há mais de duas décadas em um mesmo edifício da 314 Norte. Pagando sempre antes do dia 5, ele economiza R$ 45. “Este imóvel é o meu patrimônio, tenho que zelar por ele”, comenta o proprietário, pouco incomodado com os R$ 600 de taxa extra, mais da metade do valor total e pagos, em tese, ao longo de três anos. “Dói no bolso, mas o prédio estava precisando de reforma”, emenda Alves, apontando rachaduras na fachada.
As constantes obras, que transformaram Brasília em um paraíso para empresas de construção civil, precisam ser decididas em assembleia, uma vez que demandam um rateamento à parte. O aposentado Abraão Gebrim, 63, mora na 409 norte desde 1974. Há mais de cinco anos, paga taxa extra de R$ 350, além dos R$ 300 de condomínio. As reformas na área externa do prédio começaram no início deste ano. Quando concluídas, terão custado cerca de R$ 240 mil aos condôminos. “Pesa muito no orçamento. Tenho apenas minha aposentadoria. Gostaria que a taxa fosse menor que o condomínio, pelo menos, mas aí a obra demoraria muito a sair do papel”, conta.
No edifício administrado por Carlos Rodrigues, 60, a taxa adicional de R$ 110 começou em 2008 por conta de uma obra já concluída. Como as contas estavam sempre apertadas, os moradores decidiram incorporar o valor à taxa fixa. “Foi a solução encontrada para continuarmos virando o mês no azul”, afirma o síndico, que comemora um dos poucos casos de 100% de adimplência no Plano Piloto. Sem sobra de receita, o condomínio tem um funcionário que faz tudo. “Seria ideal contratarmos ao menos um vigia”, explica.
Complexos de luxo
Em condomínios maiores, com mais de uma torre de apartamentos, lojas e prestação de serviços, a gestão apresenta novos desafios, justamente por envolver mais gente e, consequentemente, mais dinheiro. Somente o Ilhas Maurício, no Park Sul, movimenta cerca de R$ 2 milhões por ano, incluindo as taxas desembolsadas pelos cerca de 800 moradores, os aluguéis pagos por quem ocupa espaços nas áreas de lazer e as arrecadações extras. Apenas a folha de pagamento mensal chega a quase R$ 120 mil.
Para gerir o complexo residencial, os moradores contam com a ajuda de 50 funcionários, entre porteiros, seguranças e auxiliares de serviços gerais. “A administração de um grande condomínio é como a de uma pequena prefeitura”, compara Edman Nóbrega, 55, morador e conselheiro fiscal. “Temos que ter muita disposição. É um envolvimento diferente, porque queremos zelar pela nossa casa”, completa o síndico Paulo Dazen, 70. O salário de um administrador predial varia de um (R$ 724) a cinco salários mínimos (R$ 3.620).
Há 10 anos no ramo de condomínios, o gestor Ricardo Araújo, 36, diz que faltam profissionais qualificados no mercado de Brasília, embora a demanda só aumente. “Surgiram muitas oportunidades e os profissionais não acompanharam essa evolução. A figura do zelador, que cuidava do prédio inteiro sozinho, não é mais suficiente”, opina. Para ter à disposição cinema, academia e espaço gourmet, as taxas mensais costumam ficar em torno de R$ 1 mil. “Vale a pena pagar mais do que a média pelo conforto”, avalia o arquiteto e morador Wellington Fernandes, 30.
Radiografia do DF
Os principais números de um mercado bilionário
9 mil - Quantidade de prédios residenciais espalhados pelas regiões administrativas
1 mil - Número de edifícios com administração terceirizada
300 - Total de administradoras de condomínios no DF, responsáveis pela criação de quase 2 mil empregos
Resumo médio dos gastos
Folha de pagamento de funcionários 60%
Água, saneamento e energia 25%
Manutenção de elevadores e/ou despesas corriqueiras, como compra de materiais de limpeza 15%
Taxa de condomínio
Varia entre R$ 200 e R$ 3 mil
Valor médio R$ 500
10% - Taxa de inadimplência média. Em casos extremos, pode passar da metade dos moradores
30% - Percentual de condomínios com algum tipo de reforma em andamento e, portanto, cobrança de taxa extra em vigor
10% a 12% - Variação média do reajuste anual da taxa de condomínio
R$ 2,6 bilhões - Movimentação anual dos edifícios, somente com taxa de condomínio
30 mil - Empregos criados diretamente pelos condomínios (zeladores, vigias noturnos, porteiros, auxiliares de serviços gerais)
120 mil - Empregos gerados indiretamente, pelos condomínios (terceirização de serviços gerais, contadores, engenheiros, construtores, administradores, advogados, síndicos profissionais e outros serviços voltados para condomínios)
124 - Número de processos em andamento no TJDFT, relacionados a acusações contra síndicos, causas trabalhistas e casos de inadimplência